RECORTE DE IMPRENSA | 26.10.2024 | JN

Partilhamos a publicação do @jornaldenoticias, na edição deste sábado, sobre a medida assumida pelo nosso Agrupamento, relativamente à não utilização dos telemóveis na escola. Na maioria das escolas dão-se os primeiros passos, enquanto a nossa experiência já se encontra robustecida pelos seis anos desde a sua implementação. Parabenizamos os nossos alunos pela forma como se comportam e por poderem continuar a ocupar os seus tempos livres na escola, com atividades lúdicas e promotoras de sociabilização.

Saudamos o Jornal de Notícias pela iniciativa, em especial, aos jornalistas que estiveram conosco no decorrer desta semana.

Vamos, então, ao artigo (na versão digital):

Escola sem telemóveis há seis anos faz balanço positivo

Alunos são obrigados a deixar o telemóvel em cacifos à entrada da escola da Ponte, em Guimarães
Foto: Miguel Pereira

Logo que se entra na Escola EB 2,3 e Secundária Arqueólogo Mário Cardoso, na vila de Ponte, concelho de Guimarães, percebe-se que há qualquer coisa no comportamento dos alunos que não corresponde à expectativa. Já não é normal ver um grupo tão grande de crianças e adolescentes, sem que ninguém esteja debruçado sobre o ecrã. Neste estabelecimento de ensino o uso do telemóvel foi banido há seis anos e todos – alunos, professores, auxiliares e pais – estão satisfeitos com a decisão. Na EB 2,3 de Caldas de Vizela, depois da recomendação do Governo para proibir a entrada de “smartphones” nos espaços escolares do 1.º e 2.º ciclo e para a implementação de medidas restritivas no 3.º ciclo, estão a dar os primeiros passos e, numa primeira análise, os resultados são positivos.

Quando, há seis anos atrás, no início do ano letivo, uma mãe chegou à escola e, num grito de pedido de ajuda, virou para cima de uma mesa um saco contendo, lâminas e pontas de x-ato e disse: “Diretor, ajude-me! Estas são as coisas com que a minha filha se corta”. Artur Monteiro, atualmente com 69 anos, 50 a dar aulas, percebeu que tinham chegado a uma situação limite e que era preciso fazer alguma coisa. “Os factos nem tinham acontecido no espaço escolar, foi durante as férias de verão. Mas ia continuar na escola e, além disso, havia todo um conjunto de problemas relacionados com os telemóveis que era preciso erradicar”, recorda. O fenómeno conhecido por “Baleia Azul” ficou, por aqueles dias, tristemente conhecido por a imprensa ter revelado vários casos de adolescentes que eram incitados a cumprirem desafios de automutilação.

“Foi a gota de água para uma medida sobre a qual já tínhamos falado”, reconhece Artur Monteiro. Anabela Pinheiro, auxiliar de ação educativa, com 28 anos de experiência, diz que “foi o melhor que podiam ter feito”. Não tem conta ao tempo que passava a dirimir problemas causados pelo uso dos telefones. “Mensagens carregadas de violência e insultos. Fotografias e vídeos, feitos sem consentimento ou partilhados sem refletir e usados para humilhar”, recorda. 

“É tranquilo, andei na escola na Suíça e lá também não levava telemóvel. Acho que é uma boa medida. Mas tenho colegas que não gostam, não estão habituados.”
Isabela Nunes, aluna do 9º ano da Escola EB 2,3 e S de Ponte
Foto: Miguel Pereira

Convencer os pais

Ainda assim, a professora Ana Nave, adjunta da direção, lembra que o mais difícil foi convencer os pais. “Se eu lhe comprei um telemóvel, o meu filho tem o direito de o usar”, chegou a ouvir. “Como é que eu contacto os meus filhos?” – era uma dúvida frequente. “Cheguei a ter reuniões com 200 pais e, em alguns momentos, foi preciso ser muito gráfico relativamente ao risco que os filhos corriam”, conta Artur Monteiro.

A medida foi adotada e hoje a contestação é residual. “Ainda há pais que não matriculam os filhos aqui porque sabem que os telemóveis são proibidos”, reconhece o diretor. Raul Matos, presidente da mesa da Assembleia da Comissão de Pais, tinha um filho no 7º ano quando a medida foi adotada, está agora no 12º. “Foi ótimo. Todos os alunos da turma dele têm bons resultados na Secundária e percebe-se que têm competências sociais acima da média”, refere.

“Acho bem, assim o nosso cérebro é estimulado com mais coisas e estamos mais concentrados nas aulas.”
Salvador Cunha, aluno do 5º ano da Escola EB 2,3 e S de Ponte
Foto: Miguel Pereira

Agora inventam jogos

À saída do gabinete da direção, há uma roda de alunas sentadas no chão. “Estamos a jogar Uno”, dizem. “Jogam à sueca, xadrez, jogam à bola, inventam jogos. Antes não faziam nada”, relata Anabela Pinheiro. Na EB 2,3 de Caldas de Vizela, o coordenador dos auxiliares, Jorge Ribeiro, chegou a encontrar alunos deitados a “teclar”, durante os intervalos. O estabelecimento vizelense tinha feito uma experiência com uma turma do 6º ano, no ano letivo transacto. “O feedback era positivo e, quando chegou a recomendação, que está muito bem feita e fundamentada, não tivemos dúvidas em implementar”, refere a diretora Fátima Cepeda. 

Rosário Duarte, professora de Geografia, admira-se com o “requinte perverso” de alunos do 5º ano que “eram capazes de escrever mensagens a ofender que logo de seguida apagavam para eliminar as provas e de outros que faziam ‘prints’ desses textos para fazerem acusações”. Apesar da experiência ainda ter poucas semanas, Sandra Pereira, professora de Educação Musical, está convencida. “Os alunos chegavam às aulas em agitação motora, ainda com o telemóvel na mão – ‘estou mesmo a acabar’ -, um quadro de vício, isso agora mudou”, assinala. 

Acordo para proibir

A direção da Escola EB 2,3 S de Ponte reconhece que, depois de tomar a decisão de proibir o uso dos telemóveis, se confrontou com a questão legal. “Agarramo-nos ao Estatuto do Aluno, embora este só proíba a utilização em locais onde decorram aulas”, refere o diretor, avançando que se tratou mais de um acordo entre todos os agentes.

Logística da operação

Nestas escolas, os alunos não deixam de levar os telefones. À entrada para a primeira aula, os equipamentos são depositados numa caixa que é guardada por um auxiliar que fica responsável pela sua devolução após o último tempo.

Alunos contactáveis

Estas escolas facilitam o uso do telefone fixo pelos alunos para fazerem e receberem chamadas dos pais, nos casos em que isso é necessário. Acabasse o “mau hábito de telefonar à mãe sempre que terminam um teste”, como relata a professora Rosário Duarte.

Jornalista Rui Dias, in @jornaldenotícias

Podes consultar, ainda, a versão que saiu em papel.